Onde o Henrique Pereira dos Santos, no seu "post" fala de "demagogia",
suponho que queria dizer "demografia", uma das minhas competências
profissionais, ou, talvez, "democracia", que aprendi desde o berço, em
Vilarinho da Furna - Uma Aldeia Comunitária, título da primeira tese de
Doutoramento de Jorge Dias, em 1944, em Munique.
"Demagogia?... Demagogia?... O que é isso?"..., não, não conheço... Deve ser coisa de político.
Por outro lado, se não faço parte da população residente da Peneda-Gerês é
porque me afundaram a terra, como é sabido. Mas nem por isso deixo de ser de
lá natural. Por favor, não me obriguem, por agora, a recordar novamente
coisas tristes...
E, se, como diz, o que "as áreas protegidas pretendem proteger são valores
nacionais", então que a nação contribua para esses valores locais, coisa
que não tem acontecido. Se exceptuarmos um ou outro caso de "ganha pão" para
(poucos) funcionários, naturais dessas áreas, não conheço um único benefício
(alguém conhece?) que o estatuto de "áreas protegidas" tenha trazido às
zonas onde estão implantadas. Com mágoa o digo, porque, modéstia à parte,
fui um dos dinamizadores do PNPG, sem nunca daí receber um cêntimo, com o
Eng. Lagrifa Mendes, de saudosa memória, mesmo ainda antes da oficialização
desse Parque. Até ofereci ao PNPG um Museu e uma ponte medieval, em pedra
granítica, sem contar com a disponibilização das serras, de Vilarinho da
Furna, e não só, sem qualquer benefício e um ror de problemas. Talvez por
isso, temos as piores áreas protegidas da Europa, para não dizer do planeta.
Sobre essa matéria, permito-me transcrever o mais que insuspeito Prof. José
de Almeida Fernandes: "Que reacção se espera do cidadão a quem um estranho,
representante da autoridade, venha obrigar a utilizar o que é seu segundo
critérios que lhe são alheios e que não entende? Que colaboração se pode
pedir a este cidadão para a correcta gestão da utilização da sua propriedade
privada? Onde pára o preceito constitucional do direito de propriedade?
(...) Desçamos à realidade concreta. Há que pagar, indemnizar, todos aqueles
que tiveram o "azar" de se verem incluídos nos perímetros das áreas
classificadas, e se perguntam porque lhes coarctaram os direitos e lhes
mantêm os deveres, ou até os aumentaram, em relação aos que tiveram a
"sorte" de ficar fora desses perímetros. Supomos que não há um mínimo de
justiça equitativa neste caso, mas é isto que tem acontecido no nosso país"
(in Do Ambiente Propriamente Dito, IPAMB, Lisboa, 2001, p. 145).
É natural que o Henrique tenha uma ideia do processo judicial de que falei,
pois enviei cópia da referida sentença e de uma outra em que o Director do
PNPG de então também fora condenado, por me andar a difamar, por carta
d'AFURNA, de 12/04/96, Ref ICN196, e recebi resposta, assinada por
Henrique Pereira das Santos, na qualidade de Vice-Presidente do ICN, com a
data de 5/06/96, Ref 03967. Curiosamente, dois dias depois de eu ter
felicitado, por fax, a Direcção do ICN pela demissão do referido Director,
de triste memória. Penso que será fácil ao Henrique ter acesso a essa
correspondência, para tirar todas as dúvidas.
Quanto a essa sentença, apenas uma ligeira rectificação: na citação por mim
feita no "post" anterior, utilizei a cópia da Acta do processo, quando, na
versão final, ficou escrito que "O Parque Nacional da Peneda-Gerês entregou
neste momento a soma de seiscentos mil escudos, que o réu Manuel Antunes, na
qualidade de presidente da Direcção da mesma Afurna, declara ter recebido".
Nestas condições, não me importava de ser réu todos os dias...
E, na referida sentença ficaram bem claras e reafirmadas, mais uma vez, as
confrontações da propriedade particular do Monte de Vilarinho da Furna, que,
no âmbito do mesmo processo, foram objecto de uma verificação no terreno,
pelas delegações da AFURNA e do PNPG, às ordens do Tribunal. Como
reafirmados foram também os privilégios do mesmo povo de Vilarinho na Mata da
Albergaria.
Querem mais sentenças sobre a propriedade privada do Monte de Vilarinho da
Furna? Pois aí vão elas: sentença de 15 de Outubro de 1962, no Tribunal de
Vila Verde, Acção Sumária nº 4226, 2ª Secção, em que o estado salazarista é
condenado, depois de 16 anos de processo (está publicada no meu livro
Vilarinho da Furna - Memórias do passado e do futuro, com muita outra
documentação, inclusive fac-simile do registo predial da propriedade);
sentença de 31 de Julho de 1969, no Tribunal de Vila Verde, Acção Ordinária
nº 5454, 2ª Secção, em que o estado marcelista é condenado e impedido de
fazer um estradão, do Lindoso para a Portela do Homem; 30 sentenças, no
Tribunal de Vila Verde, em processos de inventário para habilitação de
herdeiros do Monte de Vilarinho da Furna; sentença no Tribunal de Vila
Verde, em que uma cidadã é condenada a reconhecer que a AFURNA tem
legitimidade para cobrar portagens na barragem de Vilarinho, e posterior
sentença condenatória por crime de difamação.
Como vê, Henrique, se há coisas que não faltam são sentenças definitivas
sobre a propriedade da terra, em Vilarinho da Furna. Por isso, mesmo que o
meu povo de lá tenha partido, ao contrário do que o Henrique pensa, continua
com os seus direitos de propriedade sobre os montes particulares, usados de
forma comunitária, o que é bem diferente de "montes comuns". Leiam Link,
Tude de Sousa, Jorge Dias, Ernesto Veiga de Oliveira, Fernando Galhano, Benjamim Pereira, Miguel Torga, Jaime Cortesão, Hugo Rocha, Rosado e Delmira
Correia, Aquilino Ribeiro, Francisco Duarte Mangas, Gladys Novaes, A. Lopes de Oliveira, Armando de Castro, Alfredo Mendes, José Riço Direitinho, João Pedro Reino, Lucinda Duarte, Manuel Antunes e tantos outros, e aprenderão a diferença.
É por estas e por outras que a terra de Vilarinho nunca foi tomada pelo
Estado. Mas talvez isso tenha sido mais uma razão para nos terem tentado
fazer desaparecer com uma barragem. Registamos a declaração do Henrique "que
provavelmente teria sido contra" a barragem, embora não tenha a certeza,
pois, pelos vistos, o matagal recuperado nas encostas de Vilarinho e que, de
dois em dois anos, apenas serve para combustível para o espectáculo nacional
dos incêndios (cf. os incêndios de 2000, de 2002, de 2004, de 2006, onde não
arderam apenas 300 hectares, mas, seguramente, mais de mil), basicamente por
falta de acessibilidades, como foi reconhecido pelas entidades competentes
na matéria. Preferir esse matagais à vivência de toda uma comunidade de 250
pessoas, com milhares de animais caprinos, ovinos, bovinos, cavalares, que
se alimentavam na serra, onde os matos eram roçados e os fogos controlados
em tempo oportuno, é, no mínimo, algo de mau gosto.
E, quanto às fotografias de que fala, espero que o Henrique me dê, no
mínimo, o benefício da dúvida, de não pretender que, pelo menos no que me diz
respeito, os americanos venham ensinar o "padre nosso ao vigário".
Desafio qualquer um, americanos inclusive, com toda a sua força aérea, a apresentar qualquer
levantamento fotográfico e não só, de Vilarinho da Furna, tão exaustivo como
eu o fiz. Parte desse levantamento anda por aí publicado e está em exposição
no Museu Etnográfico de Vilarinho da Furna. É só ir lá ver.
Mas, já que o Henrique confia tanto nas fotos do americanos, faça favor de
reparar que os caminhos que AFURNA previa no projecto de 1989 eram,
genericamente, os que já estavam e estão implantados no terreno, desde
tempos imemoriais, quer como caminhos de carro de bois, quer como carreiros
de pé posto. E que vêm perfeitamente assinalados na Carta Militar de
Portugal nº 30, dos anos de 1940 a esta parte, nos ortofotomapas do
Instituto Geográfico e Cadastral de várias versões, em planimetria e
altimetria, e que, na quase totalidade, já foram objecto de um levantamento
por GPS, pelas equipas d'AFURNA. Portanto, caro Henrique, esteja à vontade, podemos
conversar sobre isso quando quiser.
Com a maior consideração,
Manuel Antunes
O Jornal EXPRESSO, na sua edição de 24/02/2007, coloca o Ministro do Ambiente, Nunes Correia, entre os "baixos". Como aí se refere, "a provada incapacidade em conter o mar na Costa de Caparica e a denúncia de que, volvidos seis meses sobre os incêndios no Gerês, ainda não foi plantada qualquer árvore, não abonam a favor do Ministério do Ambiente. No Gerês, a culpa parece ser da falta de verbas do Parque Natural; na Costa, diz-se que há muito dinheiro deitado ao mar. Sugere-se uma troca de verbas".
Bem observado!
Agora compreende-se porque um Comunicado d' AFURNA, sobre o último incêndio no monte de Vilarinho, enviado por e-mail para o Gabinete do Ministro do Ambiente, em 2/09/2006, só foi lido em 19/10/2006:
"Your message
To: Gab Min Amb Ord Territ Desenv Regional
Subject: Fogos no Parque Nacional da Peneda-Gerês
Sent: Sat, 2 Sep 2006 23:50:34 +0100
was read on Thu, 19 Oct 2006 15:06:09 +0100"
sem que merecesse, até agora, qualquer resposta.
Parece que o "Simplex" (e não só) anda arredado do referido Ministério!...
Informações
De Vilarinho da Furna à Aldeia da Luz...
Incêndio em Vilarinho da Furna
Livro sobre Vilarinho da Furna
Ambiente
Academia
APD - Ass. Port. de Demografia
Sociologia - Página dos Alunos
Cultura
MINOM - Movimento Internacional Para uma Nova Museologia
Política
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